domingo, 5 de fevereiro de 2012

Moça do Bar

  Mais uma vez chego no bar e ela tá la, tomando a mesma cerveja, no mesmo canto de sempre.
  Ela frequenta aquele local todo dia, e eu também. Gosto de estar lá, gosto de vê-la. Ela sempre tão bonita, me parece ter em torno de 27 anos, pele bronzeada, cabelos longos, olhos claros.
  Sozinha, sempre sozinha. Hoje ela veste uma blusa preta e um jeans claro, normalmente ela tá de jeans claro, salto alto sempre. É verão, a marca do biquíni no corpo dela me provoca, mas como sempre, continuo somente a observar, como de costume.
  Hoje notei alguma coisa diferente nela, me parecia cansada, não usava batom e bebia vodca. Fiquei intrigado, afinal nunca nesses meses todos havia visto ela tomando vodca.
  Por mais que me pareça a bebida mais adequada para ela, porque à vejo como uma mulher muito forte, achei estranho. E achei mais estranho ainda quando chegou aquele cara. Alto, magro e velho.
  Não me contive, precisei me aproximar, afinal não conseguia acreditar que a mulher por quem eu nutria um amor platônico estava sentada com outro cara dividindo a mesma bebida.
  Logo, escorei-me na parede, numa mão o cigarro, na outra a cerveja. Adquiri esse hábito depois de algum tempo vendo como parecia ser bom isso, afinal era assim que ela tava todas as noites.
  Eles falavam baixo, como se não quisessem ser ouvidos, ela sempre com a cabeça baixa, não ousava olhar nos olhos dele, parecia que tinha medo, por mais alta que a música estivesse ela não se aproximava muito, até agora não entendo como eles conversavam, o tom era baixo demais.
  Ficaram ali durante 2h. Depois de alguma frase dita por ele, ela finalmente olha no fundo dos olhos dele, como se fosse dizer: vá embora, não foi preciso, ele levantou, deu de ombros, deixou o copo pela metade. Ela bebeu o dela e logo terminou o dele. Suspirou, como se sentisse alívio.
  Naquela noite a vontade que eu tinha de sentar ali com ela, era absurda. Mas me contive por mais alguns muitos minutos. Ela fumava compulsivamente, até que o cigarro acabou. Sorte a minha, pois ela virou pro meu lado e pediu um cigarro, eu dei, era o mesmo cigarro que ela fuma. Ela acendeu, ofereceu o isqueiro, eu aceitei e acendi meu cigarro, embora não estivesse tão afim de fumar, quis fazer companhia a ela. Agradeceu, bebeu mais umas 4 doses e foi embora. Nunca tinha visto ela beber tanto, mas saiu caminhando normalmente, pegou as chaves do carro e foi pra casa, sei que foi pra casa pois ja a segui várias vezes e é sempre esse o rumo que ela toma depois que sai daquele bar.
  No outro dia, eu tava lá, de pé, perto da mesa que ela senta, quem sabe se talvez o cigarro dela não acabaria hoje também, então eu estaria ali pronto para oferecer o meu. Mas ela não apareceu, nem naquele dia e nem nos muitos outros que se seguiram. Fui algumas noites até a frente do apartamento dela e fiquei algumas muitas horas por la, na esperança de vê-la, mas nada disso aconteceu. Então voltei ao bar, resolvi perguntar por ela para uma das funcionárias, ela era muito amiga de todas, especialmente de uma, a que trabalhava a mais tempo lá. Quando perguntei pela moça de cabelos longos que sentava todos os dias naquela mesa, a mulher fez uma expressão muito triste e respondeu: ela sofreu um acidente, não sobreviveu.
  Para meu desespero, ela ainda me falou tudo que nunca me atrevi a perguntar, o nome, da onde era, o que fazia da vida e porque frequentava aquele bar todos os dias.
  Depois disso, não deixei de frequentar o "nosso" bar, mas passei a sentar-me na mesa dela, e beber como ela, e fumar como ela, e a me lembrar daquela mulher por alguns anos seguintes, até terminar a faculdade e voltar para meu estado. Pois eu tinha na época apenas 19 anos, hoje, com 24 anos, sou veterinário e pretendo me especializar em animais de porte grande, afinal, sempre fui rústico, embora muito educado.
  Ainda que nunca mais volte naquele bar, vou sempre me lembrar daquela mulher, bonita, pele bronzeada, olhos claros, e sempre sozinha, porque nunca atrevi-me a pedir para sentar ao lado dela e pagar as muitas cervejas que ela tomava e aprender tudo que ela tinha para ensinar.
  Mas com ela, ou com a morte dela aprendi uma coisa que me teve muita valia, aprendi a nunca deixar para depois.
  Por isso há 2 anos atrás resolvi me casar, hoje sou pai de uma lida menina, cabelos longos e olhos claros, igual a moça do bar...


Carol

sábado, 4 de fevereiro de 2012

"Amadurecer talvez seja descobrir que sofrer algumas perdas é inevitável, mas que não precisamos nos agarrar a dor para justificar nossa existência."

Martha Medeiros